GENTE QUE QUER CRESCER

Wednesday, April 16, 2008

EPIGRAMA

EPIGRAMA

Olha a vida primeiro, longamente, enternecidamente,
Como quem a quer adivinhar...
Olha a vida, rindo ou chorando, frente a frente,
Deixa depois o coração falar.

Ronald de Carvalho

Saturday, April 05, 2008

ABRIL

Meu luar
Nesta manhã de Abril estás
Nos meus ramos e folhas;
A canção que na corrente da tua melodia
Inunda as estrelas
Soa agora no pátio
Enquanto o meu coração bate a compasso.
Todos os meus botões rebentam em flor
Quando ris;
O vento sul embriagado com o perfume
Das minhas flores perdeu o rumo.
Ó Brancura, enviaste uma onda de cor
À minha alma;
O meu coração que murmura enredou-se
Na rede do teu riso.
Rabindranath Tagore

Friday, April 04, 2008

OLHAR



"DIRIGE O TEU OLHAR PARA DENTRO

E ENCONTRARÁS

MIL REGIÕES NO TEU ESPÍRITO

AINDA POR DESCOBRIR.

VIAJA NELAS E SÊ

ESPECIALISTA EM COSMOGRAFIA CASEIRA"


(Thoreau)

Thursday, April 03, 2008

ROSAS


ROSAS

Rosa! És a flor mais bela e mais gentil
Entre as flores que a natureza encerra;
Bendito sejas tu, ó mês de Abril
Que de rosas inundas toda a terra!

Brancas, vermelhas ou da cor sombria
Do desespero e do pesar mais fundo,
Sois símbolo d'amor e d'alegria
Vós sois a obra-prima deste mundo!

Ao ver-vos, tão bonitas, tão mimosas
Esqueço a minha dor, minha saudade
P'ra só vos contemplar, ó orgulhosas.

Eu abençoo então a Natureza,
E curvo-me ante vós com humildade
Ó rainhas da graça e da beleza!

Florbela Espanca

Wednesday, April 02, 2008

NOS CAMINHOS DA VIDA - II

Continuamos com a história da Geny. Dizia eu que tinha casado porque "teve de ser"....

Mas, uma luz brilhava e iluminava esta vida. Dentro de si, o embrião de um novo ser crescia e dava-lhe força e até alegria para seguir em frente, esquecendo as agruras do passado. Esse pequenino ser crescia, na mesma medida em que cresciam os seus sonhos e esperanças. Agarrou-se a ele como quem se agarra a uma tábua de salvação. Era algo que tinha de si e para si.
Diz-se que a "vida, às vezes, é madrasta". De facto, a vida que já tinha sido tão madrasta para esta mulher, foi-o mais uma vez. A uma semana do parto, a Geny perdeu o seu bébé num acidente estúpido e brutal. Perdeu o bébé, perdeu a possibilidade de voltar a ter filhos e ia perdendo a própria vida. E, a luz do seu olhar que se tinha iluminado por breves tempos, voltou a escurecer-se. Ao sofrimento já existente juntou-se mais este. Valia a pena continuar a viver? Não seria preferível acabar com isto de uma vez por todas? A sua vida foi-se arrastando entra estas e outras interrogações, procurando alívio aqui e acolá, procurando respostas e soluções. Pelo meio aconteceram amores e desamores, consequência da sua fragilidade, e busca de preenchimento para aquela falha original motivada pela ausência de carinho paterno e materno.
Mas a Geny já tinha demonstrado para si própria que era uma mulher forte e que não ia entregar-se e desistir à primeira. E a prova é que aí estava ela, diante de mim, a pedir ajuda.
Nestes últimos tempos a psicologia fala muito de "resilência", termo utilizado para designar pessoas que, tendo tido uma infância e adolescência marcadas por muito sofrimento, conseguem "dar a volta" e avançar na vida de cabeça levantada. Esta mulher é uma resiliente...
A certa altura, o pai, por quem nutria uma raiva imensa por causa das investidas e tentaivas de abuso de que tinha sido alvo desde a pequena infância e até bem tarde, entrou na fase final da sua vida.
Durante anos a fio, a Geny não conseguira encarar o pai, nem o pai a ela por motivos evidentes. Mas, ao aproximar-se do fim, este começou humildemente a olhá-la nos olhos, com um olhar diferente, como quem pede perdão. E esta mulher forte e de coração sensível dá consigo a responder a esse olhar, como quem diz: "sim, eu perdoo".
Foi um namoro de olhos durante dias e dias. Até que um dia, a Geny encontra dentro de si a coragem para lhe dizer: "pai, perdoo-te o mal que me fizeste".
A morte tem o grande dom de nos colocar face à nossa própria verdade. Se nunca tivemos coragem de o fazer ao longo da vida, perante a morte não temos escapatória. Sós connosco, tornamo-nos no nosso próprio juiz. E a sentença é, por vezes, bem dura.
Hoje, sinto orgulho da Geny. Pacificado este bocadinho de si, a relação com o pai, outras áreas da sua vida continuarão a pacificar-se. Sei que ela vai lutar por essa pacificação, pela sua felicidade, e por aquilo que quer.
E eu "torço", como dizem os nossos amigos brasileiros, para que isso aconteça bem depressa.

Tuesday, April 01, 2008

NOS CAMINHOS DA VIDA - l

Há histórias de vida que ficam em nós, quer pelo seu quê de extraordinário, pelos ensinamentos que encerram, quer como exemplos de que é sempre possível caminhar na construção de uma vida mais feliz, apesar de todas as adversidades. É uma dessas histórias de vida, que quero deixar neste espaço, porque creio que muita gente pode tirar proveito da sua leitura.
Conheci a Geny há anos, nos seus trinta e poucos. Corpo invejável, rosto bonito, sobretudo quando se abria na doçura do seu sorriso, onde se destacavam uns olhos tristes, enlutados pelo sofrimento, pela raiva, pelo ódio pela agressividade.
A Geny tivera uma infância complicada, com violência e abusos de todo o género. Mais nova duma família de sete filhos, nunca gozou daqueles mimos de que geralmente são alvos os filhos mais novos, que acabam por sofrer de carinho em excesso. Pelo contrário, da Geny parece que todos se sentiam com o direito de abusar. Por isso, desde muito cedo, foi recalcando ódios e raivas, malquereres que, de quando em vez, saltavam cá para fora em agressividades. A escola, a única instituição onde, possívelmente, lhe foram transmitidas algumas regras de sã convivência, foi o terreno fértil para a libertação de recalcamentos, o que se traduziu no abandono precoce, antes de os seus estudos terem chegado a um nível desejado.
Sem atenção, carinho e afecto, a Geny foi abrindo os seus próprios caminhos. A solidão e turbulência da infância continuaram pela adolescência fora, numa catadupa imparável. Bem cedo, casou. Casamento sem paixão, sem amor, mas porque "teve de ser" e porque a vida na casa paterna se tinha tornado insuportável... (continua)